Chegou a Caetité, em 1974, o sexto bispo da Diocese, Dom Eliseu Maria Gomes de Oliveira, natural do estado da ParaÃba, vindo de Maceió, onde era bispo auxiliar. Como o Eliseu discÃpulo de Elias (Segundo Livro dos Reis), Dom Eliseu veio trazer vida para o povo desta região. TÃpico viajante, parecia compreender as razões de quem se dispõe a ultrapassar fronteiras para buscar conhecimento e para trocar experiências singulares e plurais, ao reconhecer as identificações e as diferenças e apoiar a importante ação de continuidade das experiências de vida do lugar onde: “todo viajante busca abrir caminho novo, desvendar o desconhecido alcançar a surpresa ou o deslumbramento” (IANNI, 2000, p. 29).
Tanto o Eliseu bÃblico, quanto o Eliseu bispo de Caetité têm fortes sinalizações de profecia em meio ao POVO sofrido. Os dois foram respeitados além das fronteiras pelas ações proféticas que geraram vida cotidiana, incentivando o povo a se libertar de situações de escravidão. Ao chegar a estas terras, Dom Eliseu, com experiência missionária carmelita, no Nordeste, certamente foi motivado a dar continuidade à s muitas viagens que fez, dessa vez para esta extensa Diocese de Caetité.
Veio para demarcar outros espaços sertanejos e ampliar o conhecimento dessa ampla e diversa região nordestina, também, seu berço natal. Muito natural que chegasse com essa ideia de criação das muitas Comunidades Eclesiais de Base – CEBs, pois bem sabia que era desse esforço conjunto, que iria colaborar para que o povo lutasse por melhores condições de vida.
Para contribuir com a criação das comunidades, viajou incansavelmente por esta Diocese, nesse intuito de quem pensa que a manifestação da fé desencadeia a energia que é força para a ação.
Além de significativas tarefas do bispado, dois importantes propósitos tinha Dom Eliseu, como bispo da Diocese de Caetité. Colaborou com a criação e o funcionamento da Rádio Educadora Santana de Caetité, emissora em frequência AM e com missão evangelizadora. Viajou pelas comunidades dessa região e, através dessas organizações, conseguiu formar um “clube de sócios” para a manutenção da Rádio. Com essa ação parceira com as comunidades, a pastoral diocesana foi se despontando, crescendo em organização e participação e os inúmeros encontros com lideranças começaram a acontecer pelas primeiras pastorais.
Da criação da Comissão Pastoral da Terra — CPT, muitas outras Pastorais foram surgindo, na Diocese, como condição de garantir a presença da Igreja junto à s lutas populares. Com essas organizações, as iniciativas em defesa dos trabalhadores, principalmente os rurais, sua organização e conscientização passaram a se desenvolver, demarcando um começo de melhorias para os espaços rurais, cujo abandono polÃtico era visÃvel, como destaca Bueno (1998), que, ao discutir a formação do Brasil moderno questiona essa passagem acelerada do campo para a cidade, fazendo do espaço presente a convivência com várias épocas históricas.
Pela escuta a esses comunitários, os agentes diocesanos têm cumprido um papel relevante e isso se fez possÃvel pela organização comunitária. Por ela, surgem as muitas ações que instigaram e instigam o povo a buscar alternativas de poder viver em cenários como os rurais e de forma mais digna. Para apoiar essa luta, contou-se com os muitos missionários, a exemplo da parceria colaborativa dos padres italianos (missionários fidei donum) que chegam na época de Dom Eliseu, para esta Diocese. O pioneiro foi o padre Aldo Lucchetta, que chegou no ano de 1973. Veio foragido da polÃcia, da ditadura militar em São Mateus, EspÃrito Santo, cuja perseguição se deu pelo fato de apoiar na implantação das Comunidades Eclesiais de Base — CEBs.
Entre fé e vida, Dom Eliseu lutou em prol do social em um perÃodo bastante perverso na história do Brasil. Mesmo saindo da 49ª posição para a 8ª Economia do mundo, ostentando o tÃtulo de 4º paÃs exportador de alimentos dominando 43% da produção industrial da América Latina e possuidor de um parque industrial moderno, dentre outros feitos, o Brasil tinha, na época, polÃticas injustas que não favoreciam a distribuição das rendas. Esse mesmo paÃs possuÃa dentro do seu território 20 milhões de analfabetos, 6º lugar em subnutrição, com 60% da população subnutrida, 13 milhões de pessoas com esquistossomose no Nordeste, essa 8ª potência é um paÃs de miseráveis (HADDAD, 1989).
Muitos bispos, com palavras fortes e firmes, por meio da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil — CNBB, denunciaram todas essas injustiças e miserabilidades sofridas pelo povo. Nesse sentido, podemos citar Dom Evaristo Arns, Dom Luciano Mendes, dentre outros. Dom Eliseu, no interior do Alto Sertão da Bahia ensinava o povo a cantar, por meio das CEBs: “A vida que a gente vive é cheia de divisão, mas Deus não quer isso não, mas Deus não quer isso não” ou ainda “Só tenho enxada e tÃtulo de eleitor para votar em seu fulano educado que nada faz pelo pobre agricultor que não tem terra para fazer o seu roçado”.
Também ensinava que o povo precisava se organizar para resolver seus problemas, como destaca Figueiredo (2001), ao discutir que as casas se tornaram pequenas para acolher os comunitários. Começaram a reunir-se embaixo das árvores e com essa união, o povo providenciou escola e depois a construção da capela, considerando que a Igreja deveria ser espaço de todos e não apenas de um grupo seleto. O povo passou a ser cada vez mais presente e mostrar que existia.
Como falamos no inÃcio deste texto, foi, também, um dos seus propósitos a iniciativa de implantação, em Caetité, de uma faculdade, criada, inicialmente, como Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Caetité, hoje, transformada no Departamento de Ciências Humanas, Campus VI, Universidade do Estado da Bahia — UNEB, conforme Jornal A Tarde (1974).
Mesmo não conseguindo registrar seus feitos, deixou evidente o quanto valorizou o conhecimento de si e do social do lugar por onde passou, demonstrando sabedoria de como instigar o povo à mudança. Para Freire (2001), essa é uma tarefa difÃcil, mas é preciso fazê-la. Ao implantar, por exemplo, a Sociedade para organização do Clube de Sócios da Rádio Educadora Santana de Caetité, Dom Eliseu idealizou, também, o ensino superior, através da faculdade para Caetité. Para isso, organizou equipe de professores composta, tanto de católicos, quanto de evangélicos e, em salvador, eles receberam a formação inicial para levar em frente os trabalhos de criação de espaço acadêmico na região.
Para essa faculdade, Dom Eliseu doou o prédio que hoje é o Centro Paroquial em Caetité – CEP e o Cine Teatro Pax, antigo prédio em que já houve a projeção de filmes, durante muito tempo, especialmente, em final da década de 70 e na de 80. Como não passou documento, essa ação não se formalizou efetivamente […] (NEVES, Entrevistado em 25.01.2013).
Como não havia, na região, na época, uma equipe maior para edificar a ideia do ensino superior e, mais uma vez, não se identificou a ação parceira do poder polÃtico que pudesse enfrentar esses desafios, a tarefa de implantação da faculdade ficou a cargo de uma equipe bem pequena, liderada pelo Monsenhor Raimundo dos Anjos.
Talvez por querer viajar por outras terras, no inÃcio da década de 1980, Dom Eliseu foi ao encontro de outras viagens, em outras regiões, deixando a Diocese, a qual, mais tarde recebe Dom Antônio Alberto Guimarães Rezende, seu sucessor. Em 1980, dá-se a transferência de Dom Eliseu para a Diocese de Itabuna, sul do estado. Seu Ãmpeto missionário o faria ainda assumir — mesmo depois de se tornar bispo emérito, em 1983 — por algum tempo a função de pároco, o que fez em Mortugaba. Depois de deixar Itabuna, Dom Eliseu serviu como Capelão no Hospital Santa Isabel de Cabo Frio/RJ e também voltou para a sua terra natal. Em 11 de fevereiro de 2002, estando de volta a Itabuna para participar de um encontro religioso, veio a falecer por causa de problemas cardÃacos (SOUZA, E. A. C. entrevistado em 17-09-2011).